26 de jul. de 2010

Razão pra Cantar

   Olá pessoal! Em primeiro lugar, eu gostaria de agradecer de todo o coração o carinho de cada um de vocês.
   Obrigada àqueles que visitam e não postam, aos que postam, aos que falam comigo no dia a dia e me incentivam a continuar, aos que não me conhecem e me seguem ou mandam emails com suas dúvidas e que acreditam no meu trabalho como professora e como cantora.
   O objetivo desse blog, é compartilhar um pouco da vida do cantor profissional. As coisas super legais que fazemos, os micos e as humilhações que sofremos só porque a gente AMA nosso trabalho!
Outra coisa que pretendo fazer aqui também, é corroborar, reforçar os conceitos básicos do canto, pois à medida que cantamos, vamos nos esquecendo de alguns fatores fundamentais, às vezes técnicos, emocionais e até espirituais. Hoje, quero compartilhar com vocês um post sobre a razão de cantar. Espero que gostem!


                 Razão pra Cantar


   Primeiramente gostaria de desmistificar... Quando cantamos, não estamos planando sobre nuvens de algodão nem tampouco viajando na melodia que o compositor lindamente escreveu. Ao contrário do que parece (pois nosso rosto e corpo é treinado por anos pra parecer que estamos super confortáveis), o canto não é um ato natural. Obviamente, ele tem que ser emitido com naturalidade, mas pra que isso aconteça é necessário muito tempo de dedicação e uma razão, um motivo pra cantar.
   Sim, usamos a razão pra cantar, ao estudar uma peça, uma ária, uma canção, uma música... fazemos um mapa pra que ela se encaixe em nossa mente, corpo e alma. Falaremos sobre a escolha do repertório mais tarde, agora vamos falar do processo adequado e ideal de estudo de uma peça. (Fica subentendido que estou falando do Canto Erudito)

   1. Traduza o texto que será cantado.
Faça palavra por palavra. Pegue seu dicionário (ou google tradutor) e traduza cada palavra num caderninho. Depois junte todas elas pra que façam sentido em uma frase. Às vezes, não se consegue achar sentido, mas traduza até o fim, forme as frases que consegue e só então olhe na internet a tradução em inglês ou em português se possível. Resolva as frases que faltam e recite a tradução até fazer sentido pra você, até entender a poesia.

   2. Conheça sua música.
Faça uma busca rápida no google pra saber mais sobre o compositor da peça, conhecer seu estilo, seu modo de pensar, pra entender um pouco mais o clima da música. Pesquise no Kobbé ou na internet o contexto da obra. Se for uma ária de ópera, quem é o personagem, porque ele está cantando aquele texto, como ele se comporta enquanto canta, qual é a história e etc. Se for uma canção que faça parte de um ciclo, usa-se o mesmo processo.

   3. Fale o texto
Recite o texto sem as notas, no ritmo em voz alta pra identificar as sílabas tônicas e não cometer aquele erro básico de cantar aleluiá, gloriá, dominús e etc...

   4. Aprenda a música sozinho!
Estude solfejando. Não ouça a obra antes de estudá-la notinha por notinha no piano e solfejando!!! Por que? Ora, porque você corre um grave risco de ouvir o solista renomado fazendo o que bem entende com a partitura e quando você vai conferir, percebe que aquela interpretação não está escrita! Isso pode te atrapalhar em concursos, audições e testes onde os maestros e bancas são extremamente rigorosos e fidedignos ao que está na partitura e você será simplesmente desclassificado.

   5. Decore a música
É fundamental pra dar liberdade ao canto e independência. Deixa a interpretação brilhante e mais limpa. (Algumas pessoas decoram durante o processo, outras escrevem o texto várias vezes até decorar) Depois de ter a letra decorada e a melodia com sua rítmica correta (suprima os rallentandos, accelerandos e vizinhos), é hora de estudar a...

   6. Dinâmica
Use e abuse dos pianíssimos e não se esqueça de fazer diferença entre o p o mf e o f e ff.
Tá, vou explicar. Pode parecer óbvio, mas não é. Na maioria das vezes, sabemos fazer o pianíssimo de côro e não de solista. A diferença entre um e outro é o apoio. O apoio de um piano solista é mais fundo, mais seguro, apoiado lá embaixo nos esfíncteres, na pélvis pra poder projetar... já o de côro é mais na boca mesmo, é aquele piano que a gente faz quando vai falar baixinho com alguém, este, não projeta.

   Outro detalhe importante do piano: se a nota é longa (Veja bem, isso só vale pra ópera romântica) e tem um crescendo no meio e depois volta a ser piano, coisa básica dos italianos do período Romântico, é preciso dividir os tempos matematicamente. Vou dar um exemplo: Se temos uma semibreve valendo 4 tempos e o compositor acrescenta um delicioso rallentando sobre esta nota, ela geralmente valerá 9 tempos. Isso só vale para os finais, ok pessoal? Durante estes 9 tempos... 3 serão piano, 3 serão o crescendo e 3 serão o diminuendo.
    Agora você deve estar me achando a louca com TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo), mas não é bem assim, rs. Experimente se gravar fazendo um final, por exemplo de Caro Nome (Verdi), faça um crescendo e o diminuendo ' natural ' como geralmente aprendemos que é pra ser feito, você vai perceber que o seu piano ficou muito curto e que nem apareceu... Ô tristeza! Já é tão difícil fazer piano, quando a gente consegue colocar no buraquinho certo, tem que aproveitar, ué! Voltando...

   7. Grave-se!
 Isso deveria ser ensinado nas escolas, conservatórios e em todas as aulas de canto. Quando cantamos ouvimos diferente de quem nos ouve e por isso às vezes erramos o timbre, a cor da voz num determinado trecho e muitas vezes determinadas notas nem são ouvidas. Para evitar isso, é necessário gravar. Quando você for se ouvir, vai perceber sozinho lugares em que poderia apoiar mais, cantar mais forte ou mais piano, vai prestar atenção se consegue entender o texto que está cantando, se precisa exagerar mais na dicção e com isso, economizar tempo na hora de mostrar a peça para seu professor. Resumindo, observe timbre, notas mudas e dicção.

   8. Cante em frente ao espelho
Assim você evita fazer caras e bocas, corrige a postura, a posição da boca, percebe se a afinação está difícil por causa da expressão e ajuda a livrar-se da inibição.

   9. Dance!
Faça um mapa corporal na sua música. Descubra onde levantar o braço, onde caminhar, onde curvar a cabeça, onde estar parado, onde sorrir, onde deixar o braço ao longo do corpo... Como? Agora sim, é hora de entrar no youtube e assistir todos os cantores possíveis interpretando a peça que você vai cantar.
Estude os movimentos, crie os seus, copie outros, junte tudo e interprete diante do espelho. Deixe a música rolando no youtube e vá coreografando seus movimentos até fazerem parte da música, como o ritmo a melodia e a letra.

   10. Interprete
Tome posse do personagem e ... Divirta-se! Se você tiver estudado o tempo necessário pra incorporar cada item acima, não sentirá dificuldade e nem ficará nervoso na hora de cantar. Divertir-se significa, entrar no personagem, dar vida à ele, cantar cada palavra sabendo seu significado e movimentar seu corpo seguramente, sabendo onde ir e onde ficar. Depois de concluir este processo, você provávelmente não suporta mais ouvir a música ou a está amando com verdadeira devoção. A partir de agora é necessário cantar a música com piano pelo menos 5 vezes pra que se tenha segurança pra apresentá-la em um concurso, numa audição ou teste.

   Você pode estar se perguntando se vale a pena estudar tantas horas pra cantar uma única música. Eu, se pudesse responder olhando nos seus olhos agora... você veria meu sorriso embasbacado e eu diria com toda a sinceridade que vale a pena. Estar no palco seguro, consciente, feliz, sabendo o que está cantando... É inigualável!
   Meus motivos? Minha razão pra cantar? Vocês vão saber na semana que vem, no meu próximo post: Razão pra Cantar II

9 comentários:

  1. Quanta disciplina!!! Acho que vou fica só cantando no chuveiro mesmo!!! rsrsrs canto profissional deixo pra quem entende...NATÁLIA!!!

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  2. Gostei, gostei, rsrsrs. Muito legal. Beijinhos.

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  3. nati ameiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii, difícil hein rs

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  4. Que dureza, né Natália!!!!!! E depois de tudo isso, se o cantor(a), por azar, não estiver bem fisicamente no dia da apresentação, tem sempre um infeliz pra dizer: Ih... coitado(a), a voz já era! Não é mesmo? Nem se dão ao trabalho de imaginar tudo o que precisou ser estudado, elaborado, lapidado antes de ser levado a público. Fora os invejosos que, mesmo se o cantor(a) estiver MARAAAA, vão sempre achar um defeito pra denegrir o artista. Mas, é isso ai! Estamos nessa profissão pra dar a cara pra bater. Quem quiser que bata. Eu? Não to nem ai!!!!!!!!

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  5. Concordo com a Regina!! Mas só o fato de poder fazer esse trabalho sério já é consagração pra nós que amamos cantar! O prazer já está no estudo... ;) Parabéns pelo blog!

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  6. Eu vou é copiar todinho esse post pra colocar junto do meu material de estudo! :D!! Muito bom!!! Aposto que está ajudando muita gente além de mim também!

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  7. Adoreiiiiiiiiiiiiiiii!!!!! Será meu roteiro de apresentação musical daqui pra frente! eba!!!

    Olha lá o pedaçosliterarios.blogspot.com e o thiteconta.blogspot.com textos novos. bjs

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  8. Deus! Como é difícil ser cantor(a)...
    Te falei que estou estudando teclado no IT&T? Vai ser legal me aprofundar mais no assunto...
    Só não dá pra contar com a minha voz, que eu acho horrenda :)
    bjs!
    Giba

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  9. Parabens!
    Gostei! Muito útil,nescessário e instrutivo!Virei sua fa!
    Espero que vc continue postando esse tipo de informação inclusive com sugestões efetivamente práticas para primeiro sopranos e solistas.EStou buscando conhecer o trabalho de sopranos brasileiras e internacionais,se possivel gostaria até de ver entrevistas feitas a elas sobre suas carreiras,performances, seus conselhos pra quem deseja ser uma grande soprano, etc..Seria interessante se vc publicasse aqui.Fica aqui a sugestão!
    Muitíssimo obrigada!!!
    Grande abraço.

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